O julgamento indevido de pessoas que estudam após os 40 anos
Caso veio à tona após jovens criticarem uma mulher com mais de 40 anos a estudar
Estudar depois dos 40, 50 ou 60 anos não deveria ser motivo de vergonha para ninguém, pelo contrário. Alcançar uma graduação ou terminar o ensino básico depois de uma vida dedicada à família é motivo não apenas de orgulho mas sobretudo de inspiração para milhares de pessoas.
O caso veio à tona neste mês, depois que uma mulher com mais de 40 anos, foi humilhada por universitárias jovens, em Bauru, Interior de São Paulo. O vídeo compartilhado nas redes sociais gerou críticas e as estudantes que cometeram a ofensa, acabaram desistindo da faculdade.
Se ter acesso a educação é um privilégio ainda para poucos, por que julgamos quem se arrisca a fazê-lo em estágios mais avançados da vida?
Para a parceira científica do SUPERA – Ginástica para o cérebro e gerontóloga da Universidade de São Paulo (USP), Thais Bento Lima, o preconceito enrustido que vem à tona neste tipo de situação está ligado a características próprias desta sociedade que cultua a juventude eterna e tem medo de chegar a velhice.
“Este comportamento é influenciado por meio dos padrões de estética e de beleza estabelecidos pela sociedade; pela mídia que representou muito muito tempo e ainda representa o envelhecer de forma negativa e cheia de estereótipos que deve viver isolado socialmente, pois não é capaz de produzir e colaborar para o desenvolvimento de uma cultura”, alertou.
O preconceito que acontece na faculdade, com um aluno mais velho ou mesmo no trabalho tem nome: gerontofobia, um comportamento que faz parte dos nossos tempos e que, muitas vezes está oculto atrás de falas, elogios e brincadeiras carregadas de preconceito.
É possível aprender depois dos 40?
A resposta é: sim. Alguém mais maduro tem mais clareza no que é importante e no que não é, o que é uma compensação muito positiva.
Além disso, aprender é um processo contínuo e não está relacionado à determinada fase da vida. Aprender, lembra a especialista do SUPERA – Ginástica para o cérebro, está relacionado à promoção do envelhecimento saudável, a promoção de incentivo da aprendizagem ao longo da vida, com os direitos humanos, com a justiça social e com a igualdade.
Idadismo na faculdade
A cena – com ampla repercussão – incluindo três universitárias que caçoaram de uma estudante de 40 anos é, na verdade, idadismo. A palavra idadismo é uma adaptação para o português da expressão em inglês ageism, e segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), refere-se a pensamentos, sentimentos, ações e comportamentos, apresentados através de estereótipos, preconceitos e discriminação relacionados a idade.
“Na grande maioria dos casos, homens e mulheres estudam depois dos 40 anos porque não tiveram oportunidades quando eram mais jovens o que torna qualquer crítica ainda mais cruel. Precisamos lembrar que o Brasil está envelhecendo em ritmo acelerado, com inversão da pirâmide etária”, conta a professora – doutora Thais Bento Lima, parceira científica do SUPERA.
“Ou seja: menos jovens e mais idosos com estimativa de que muitas cidades brasileiras em 2030 terá mais idosos do que jovens. Para combater o preconceito etário, assim como recomenda a OMS, precisamos combater estereótipos e aumentar a discussão sobre temas próprios do envelhecimento, combatendo o preconceito etário, promovendo a sensibilização e a empatia; e que possam incentivar a realização de atividades entre as gerações”.
Algumas diretrizes da Unesco para todos os países do mundo, com o objetivo de possibilitar que pessoas de diferentes idades tenham acesso à educação:
- Promover a aprendizagem inclusiva desde o ensino básico ao ensino superior;
- Revitalizar a aprendizagem nas famílias e nas comunidades;
- Facilitar a aprendizagem para e no local de trabalho;
- Ampliar o uso das tecnologias modernas de aprendizagens;
- Melhorar a qualidade e a excelência da aprendizagem;
- Fomentar a cultura de aprendizagem ao longo de toda a vida;
- Promover a aprendizagem inclusiva da educação básica à alta educação.
Além disso, o Estatuto do Idoso, tem a aprendizagem como um direito para que os cidadãos de 60 anos ou mais devem ter acesso às práticas educativas.
“Na Gerontologia e nos estudos da Psicologia do envelhecimento, entendem que o indivíduo está se desenvolvendo em todas as fases do ciclo de vida, por isso não existe idade certa para aprender coisas novas, cada pessoa terá o seu tempo e o seu momento, para realizar sonhos, projetos e ter novas experiências e oportunidades”, concluiu a professora doutora Thais Bento Lima.
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