Por Maria Cibele de Oliveira Ramos Valença (Advogada)
A Justiça do Trabalho tem discutido a responsabilidade das empresas em relação à contaminação dos seus empregados pelo Covid-19.
O assunto que continua em debate refere-se à caracterização dessa doença como ocupacional, nos termos do artigo 20 da Lei de Benefícios da Previdência Social (Lei n.º 8213/91), ou seja, se há ou não nexo com o trabalho.
A discussão já vem desde 29/04/2020, quando o artigo 29, da Medida Provisória n.º 927, teve sua eficácia suspensa provisoriamente pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento das ADINs 6.342, 6.344, 6.346, 6.348, 6.349, 6.352 e 6.354.
A referida norma excluía a contaminação pelo coronavírus da lista de doenças ocupacionais, transferindo o ônus da comprovação ao empregado, cabendo a este demonstrar que contraiu a doença enquanto exercia as suas atividades profissionais, sendo relativa a presunção de responsabilidade do empregador.
Entretanto, no julgamento do RE 828.040, o Supremo Tribunal Federal entendeu ser constitucional a responsabilização objetiva do empregador (sem necessidade de demonstrar qualquer conduta ativa ou omissiva deste) por danos decorrentes dos acidentes de trabalho (aí incluídas as doenças ocupacionais e, por consequência, a contaminação pelo coronavírus) também quando as atividades desenvolvidas pelos empregados, por sua natureza, apresentar exposição habitual a risco especial, com potencialidade lesiva e implicar ao trabalhador ônus maior do que aos demais membros da coletividade.
Motivos
Tal condição foi mais evidente em relação aos setores de atividades essenciais que impunham o exercício do trabalho presencial, como supermercados e unidades de saúde, por exemplo, que não possuíam a opção de trabalho remoto associado à necessidade de contato constante entre pessoas.
É ainda mais importante a implementação do plano de retomada no trabalho presencial (ou híbrido) e a manutenção das evidências sobre a sua contínua utilização, seja para apresentação em discussões judiciais ou em fiscalizações administrativas por parte do Ministério do Trabalho e Previdência ou ainda em discussões envolvendo o Ministério Público do Trabalho.
As empresas têm obrigação de reduzir os riscos inerentes ao trabalho, cumprindo as normas de saúde, higiene e segurança no trabalho, como dever constitucional. Neste contexto, se a empresa não adotar esses cuidados (e tiver condições de demonstrá-los), há o entendimento da responsabilização do empregador pelas doenças adquiridas no ambiente e/ou em virtude da atividade laboral.
Assim, os julgados têm decidido de forma predominante como adequada a previsão de responsabilização subjetiva da empresa quando o empregado se contaminar pelo coronavírus em decorrência de não ter o empregador cumprido com as orientações, recomendações e medidas de proteção obrigatórias para enfrentamento da pandemia, pois expõe os seus trabalhadores a um ônus maior que os demais membros da coletividade.
O que deve ser feito?
Neste cenário, cabe à empresa o ônus de demonstrar que a doença não foi adquirida no ambiente laboral ou por causa do trabalho ali desenvolvido, sob pena de reconhecimento da doença como ocupacional, nos termos da Lei nº 8.213/91, com os reflexos daí decorrentes, em especial, a estabilidade provisória no emprego por, no mínimo, 12 meses após a alta médica, emissão de comunicação de acidente de trabalho (CAT), afastamento do trabalho com percepção de benefício previdenciário, etc., além de poder ensejar reparação por danos morais e/ou materiais ao trabalhador prejudicado nos autos de uma possível reclamação trabalhista.
O ideal é que as políticas e diretrizes internas relativas à saúde e segurança no trabalho sejam revistas e atualizadas regularmente, a fim de não só garantir, efetivamente, um ambiente de trabalho saudável e seguro aos colaboradores, prevenindo a contaminação dos trabalhadores inclusive pelo coronavírus, mas também visando evitar a criação de passivos trabalhistas, armazenando todas as evidências das providências até então adotadas.
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